sábado, 5 de junho de 2010

Análise da Copa do Mundo

(Bem-vindo à África do Sul)

A Copa do Mundo 2010, primeira edição da principal competição futebolística do planeta em solo africano. Desde o fim da Guerra Fria, tivemos a mundialização do Capitalismo e o processo de enriquecimento das ligas europeias - sob os auspícios do projeto de integração econômica, política e social daquele continente. Isso marcou o rompimento do paradigma nacional, onde os jogadores atuavam em seus países de origem e uma seleção brasileira, por exemplo, era sinônimo de uma seleção do Brasil e não apenas de brasileiros como é hoje. Em suma, falamos de uma competição entre times nacionais de um mundo desnacionalizado. Uma competição mundial feita para a massa de consumidores globais, jogada em um dos países consumidos pelo globo. Vale o espetáculo, muito embora o significado em parte tenha sido perdido - ou exarcebado, sabe-se lá. Para além das implicações políticas, foquemos na análise futebolística, time a time.

GRUPO A

África do Sul: É a dona da casa e tem como treinador nosso velho conhecido Carlos Alberto Parreira - treinador que jamais venceu um jogo de Copa por uma Seleção que não a Brasileira (!). Trata-se, dentre os principais países africanos, do futebol mais problemático, o que é facilmente explicado pelo fato de que o desenvolvimento do seu futebol foi duramente atrasado pelo regime do apartheid, em decorrência do qual ocorria o absurdo de existirem federações diferentes para cada uma das etnias que compõem a população local. Uma federação unificada só veio a surgir com a refundação do país nos anos 1990, mas o único título de expressão, até hoje, foi a Copa da Nações Africanas de 1996. Sua campanha pré-Copa foi um fiasco com a passagem de alguns treinadores - dentre eles, Joel Santana - e o corte de Benni McCarthy, dito maior craque do país, ainda que problemático. Mesmo que eu questione bastante os critérios do Ranking da FIFA, ver que a seleção anfitriã ocupa apenas a 88ª posição não é lá muito animador. É evidente que por ser dona da casa, a África do Sul terá chances de passar para a fase seguinte, coisa que não seria capaz fora dessas circunstâncias, mas eu suspeito que não passe muito disso - e não duvide que ela se torne o maior fiasco de uma seleção anfitriã em copas, haja visto que o elenco é limitado e formado por jogadores que atuam em times pequenos e médios do futebol europeu, sem muito destaque, eu, pelo menos, sou pessimista quanto a sua classificação para as oitavas. 

México: Prossegue disputando a hegemonia da América do Norte e Central com os EUA. No quadriênio, ganhou uma Copa Ouro e perdeu a outra - mas não chegou à Copa das Confederações de 09 porque não foi campeão em 2007. Nas eliminatórias, passou em segundo, chegando a estar ameaçado de não se classificar na breve - e desastrosa - passagem de Sven-Goran Eriksson pela time - depois trouxe Javier Aguirre de volta para chegar ao mundial e conseguiu. Os destaques do time ficam por conta de Rafa Marques do Barcelona, do experiente Blanco e do jovem Giovanni dos Santos. Gostei do que vi no amistoso contra a Itália na Béligica, onde o time venceu a azurra por 2x1, ainda é pouco para quem passou os últimos anos jogando mal e tem um histórico de fracassos em Copas, mas acho que ele consegue passar adiante, afinal, no duro é o melhor time do grupo.

Uruguai: Ano vai, ano vem e desde que a Eliminatória sul-americana passou a ser jogada em turno e returno com todas as seleções presentes, a celeste olímpica termina em quinto lugar e vai para o sacrifício da repescagem. Para 2002 e agora, deu certo, para 2006 não. O time, no entanto, não é tão ruim, tem velhos conhecidos da torcida brasileira como o zagueiro Lugano (ex-São Paulo), o atual atacante do Botafogo, Loco Abreu, e ainda Fórlan no ataque. Não creio que tenha pretensões muito maiores do que chegar até as oitavas do torneio, mas com algum esforço, consegue.

França: A seleção gaulesa teve três grandes momentos na história, a primeira no fim dos anos 50 com a geração de Just Fontaine, depois nos anos 80 com a turminha de Platini e companhia e, por fim, a geração de Zidane, campeã da Copa de 98 e na Euro 00. Depois do fiasco de 2002, quando era apontada como uma das favoritas, veio ainda as má campanha na Euro 04. Desacreditada, a seleção francesa fez uma boa Copa em 06, chegando a final com um time com idade avançada. O processo de renovação, no entanto, está sendo muito duro, a classificação para a Euro 08 foi difícil e a eliminação na primeira fase foi dolorida, a classificação para a Copa da África veio na base da repescagem. Sopesada a tradição, não creio que o time francês, envelhecido e com sua velha dificuldade de renovação de uma geração para outra, consiga chegar sequer às oitavas, a menos que algo muito relevante aconteça.

GRUPO B

Argentina: Era uma das favoritas ao título do último mundial, mas acabou sendo eliminada pela Alemanha, a anfitriã do torneio. Depois, o processo de reconstrução da equipe visando 2010 deu errado com Alfie Basile, o que levou a federação local, após a derrota na Copa América para o Brasil - de goleada, ainda - , a trazer Maradona para treinar a equipe. Idas e vindas, a Argentina se classificou na bacia das almas, não tendo vencido seu eterno rival, o Brasil, em nenhuma ocasião e ainda ter sofrido uma goleada de 6x1 para a Bolívia - e nada de títulos nos últimos quatro anos. A Argentina lembra o Brasil de 2002, um time com alguns craques - notamente Messi -, com toda uma mística envolvendo seu treinador e muito pouco, seja do ponto de vista tático ou de retrospecto nos últimos quatro anos, que lhe aponte como vencedor do torneio. Eu ainda creio que o time cresça na Copa e chegue firme, não sei se vindo de trás ou como azarão mesmo.

Coreia do Sul: Passou em segundo lugar nas eliminatórias asiáticas, disputando uns duelos interessantes contra sua rival, Coreia do Norte. Na Copa da Ásia de 07, ficou apenas em terceiro lugar, batendo o Japão nos penâltis. É um time organizado e disciplinado, mas não deve disputar vaga na oitavas não.

Nigéria: Classificou-se para o Mundial de forma invicta para o mundial e apesar de ter parado nas quartas de final da Copa da África de 08, manteve-se, nas outras edições, sempre entre os  quatro melhores times do continente. É verdade que não chega tão forte quanto em 98, onde vinha com a medalha de ouro das Olímpiadas de Atlanta. Creio que passe para a fase seguinte.

Grécia: Campeã da Eurocopa de 2004, sequer chegou na Copa de 06 e foi um fiasco na Euro 08, onde não saiu do zero. De repente, a equipe - que caiu num grupo fraco, é verdade - chegou a Copa, mesmo que dependendo da repescagem. É nesse espírito que a equipe - de um  país que está sendo engolido por uma grave crise econômica -, está chegando à África - eu não estou tão otimista assim quanto a sua campanha.

GRUPO C

Inglaterra: Terra onde nasceu o futebol, a Inglaterra primeiro demonstra um desdém total por disputas internacionais, julgando-se boa demais para confrontar qualquer seleção. Superada a marra inicial, a terra da rainha só conseguiu vencer um mundial, em 66, em uma condição bastante discutida até hoje, notabilizando-se muito mais por ser uma escola de futebol quadrada, burocrática e morna. A grande revolução do futebol inglês acontece nos anos 90 com o advento do Manchester United e seu futebol bonito, competitivo e cheio de craques - a jovem geração liderada por Beckham fracassa na Copa de 98, por imaturidade, mas depois prometia chegar longe. Os anos em que foi treinada por Sven-Goran Eriksson, no entanto, foram um somatório de decepções, onde o favoritismo local por vezes foi por água abaixo devido aos erros do estranhamente festejado treinador sueco. Depois do trauma na Alemanha e a saída de Eriksson, veio Steve McLaren e mais um fracasso: Desta vez, nem classificação para a Euro 08 deu. A reconstrução do time para a Copa da África, sob o comando do italiano Fabio Capello deu certo: Uma campanha arrebatadora nas eliminatórias locais com a classificação conquistada com tranquilidade - uma única derrota, 1x0 para a Ucrânia fora. A equipe mantém a boa base da última Copa e, suspeito, briga pelo título.

EUA: Seria a hora e a vez do time americano? O futebol masculino é uma das poucas modalidades de esportes nas quais os americanos se dão mal historicamente. Muito embora disputem com o México o posto de melhor time da banda norte do continente americano - e tenham levado vantagem nessa disputa no último quadriênio, chegando, inclusive, a final da Copa das Confederações do ano passado -, ainda falta o título mundial, o que parece um sonho distante. Ainda assim, pela chave, creio que o time americano tenha boas chances de chegar às quartas do torneio.

Argélia: Teve o mérito de eliminar o Egito, atual tricampeão africano, e qualificou-se para o mundial, fora isso, não brilhou nem nas competições africanas nem em lugar algum - este ano ficou apenas com a quarta colocação na Copa Africana e dificilmente passará adiante.


Eslovênia: Uma das partes integrantes da antiga Iugoslávia e terra do famoso filósofo Slavoj Zizek, conseguiu sua independência de um modo razoavelmente tranquilo nos anos 90 e conseguiu passar praticamente incólume pelo terror da guerra que eclodiu naquela região em virtude do esfacelamento do antigo páis socialista - sob os auspícios do nacionalismo sérvio e do intervencionismo da OTAN. Em sua breve história futebolística, a Eslovênia conseguiu os feitos de se classificar para a Euro 2000 e, dois anos mais tarde, para a Copa da Ásia, torneios que disputou como mera figurante. Depois de anos fora do grande cenário do futebol mundial, ela conseguiu superar a Polônia e a República Tcheca em seu grupo das eliminatórias europeias para depois, na respecagem, conseguir o feito de eliminar a Rússia. Depois de ter superado boa parte das melhores escolas do futebol europeu oriental, os eslovenos só têm a seu favor a união do grupo e o desejo de autoafirmação nacional próprio dos países que se tornaram independentes na leste europeu. 

GRUPO D

Alemanha: Muito embora tenham um título a menos do que a Itália na Copa, é sabido que a Alemanha é a dona do segundo melhor retrospecto em mundiais - levando em considerações os resultados da Alemanha Ocidental, haja vista que a sua contraparte oriental, em que pese ter sido uma potência olímpica enquanto existiu, jamais conseguiu brilhar no futebol. Depois da reunificação, a Alemanha ganhou apenas um título europeu (1996, na Inglaterra) - a reunificação ocorreu alguns meses depois do título mundial de 1990, na Itália -, sob a égide da geração de Matthäus e Klinsmann. As duas últimas campanhas em copas foram enganosas: Em 2002, o time chegou como azarão entre azarões e fez um final que ninguém esperava contra o Brasil, ficando como vice, depois, sediando o torneio, acabou sendo eliminada na semi-final contra a campeã, Itália - e nesse meio tempo, conseguiu o feito de não passar da primeira fase da Euro 00 e 04. A recuperação do time só aconteceu nesse quadriênio, onde o time finalmente se renovou, incorporando uma série de jogadores naturalizados que incorporam bem a diversidade étnica da Alemanha contemporânea - e um pouco dessa naturalizianismo do futebol contemporâneo, quer seja pela maior integração entre os povos ou por oportunismo mesmo - como o polaco Klose, o brasileiro Cacau. O vice na última Euro e a campanha invicta nas eliminatórias colocam o time alemão como um dos favoritos ao título.

Austrália: Agora filiados à confederação asiática e não mais à Oceania, os australianos levaram com facilidade as últimas eliminatórias continentais, mas terminou apenas em quinto lugar na última Copa da Ásia. Entra na sua terceira Copa do Mundo depois de uma campanha positiva em 2006, quando quase eliminou a futura campeã Itália nas oitavas de final, e aqui disputa - mesmo não como favorita - a segunda vaga do grupo.


Sérvia: Herdeira da camisa iugoslava, a Sérvia pagou muito caro em vidas humanas devido a violência da guerra que marcou a extinção daquele Estado: A instabilidade tremenda em suas terras - e, ainda, posteriores tensões secessionistas em seu território, mesmo quando as tensões já tinham se acalmado em seus vizinhos - fizeram com que o poderoso futebol local ficasse estagnado nas últimas décadas. Nos últimos anos, não conseguiu passar das oitavas de final na última Copa, nem classificou-se para Euro 08, mas passou com certa tranquilidade para Copa atual, num grupo com França e Romênia. Briga pelo segundo lugar do grupo, ainda que Gana seja favorita.

Gana: Liderado por Essien (Chelsea) e Appiah, o time de Gana, nossa adversário nas oitvas da última Copa, aparece novamente na Copa depois de ter ficado no terceiro lugar na Copa África 08. Ao meu ver, disputa palmo a palmo com a Sérvia a segunda colocação do Grupo, mas é favorita.

GRUPO E


Holanda: A eterna quase-campeã mundial novamente chega bem ao mundial, com um time leve, técnico, inteligente taticamente, mas sempre faltando aquele algo mais. Trata-se de uma das poucas seleções que passou os últimos quatro anos jogando bem, chegou com força na última Euro, fez uma primeira fase que lhe gabarativa para o título - até que foi surpreendida pela Rússia -, depois classificou-se para a Copa com uma campanha perfeita de oito vitórias em oito jogos. Seu treinador, Bert van Marwijk, tem a disposição craques como Robben - ou talvez não -, Kuyt, Seneijder entre outros, tendo a tarefa de transformar o espetáculo em campo em algo realmente efetivo. Eu creio que a laranja leva fácil o grupo, o problema é mais adiante,    imaginar esse time jogando um futebol bonito não resta dúvida, agora imagina-lo ganhando um título é mais complicado - muito embora, ele, mais do que muitos, merecesse.

Dinamarca: O pequeno país nórdico teve seus momentos na história do futebol mundial, principalmente no um círculo virtuoso que vai de 1984 até 2004, onde o time foi presença constante na Eurocopa, venceu o torneio em 1992, ganhou a Copa das Confederações em 1995, além de ter emplacado três classificações para mundiais, sendo a última, em 2002,
quando chegou às oitavas de final. Desde o fim da geração dos irmãos Laudrup, no entanto, o time não conseguiu se renovar, tarefa normal e corriqueira para um país continental como o Brasil, mas longe de ser simples para um país de suas proporções. De qualquer modo, apesar da desclassificação para a última Copa da Alemanha e para última Euro, veio nessas eliminatórias a classificação para a África: Liderança em um grupo que contava com Portugal e Suécia, com direito a vitória contra os dois rivais fora e apenas uma derrota. Se mantiver a pegada, o time do veterano Morten Olsen, leva a segunda vaga do grupo.

Camarões: Até meados dos anos 80, os únicos times africanos que se destacavam no cenário mundial eram os norte-africanos - e muito mal. Isso se dava por motivos óbvios, as guerras de descolonização pegavam fogo, piorando a vida que já não era fácil nos tempos de colônia, enquanto o regime do apartheid impedia que o futebol sul-africano se desenvolvesse. Ainda que times como Gana, a Etiópia ou Congo já tivessem sido campeões africanos, o grande ponto de inflexão do futebol africano é mesmo aquela campanha de Camarões na Copa de 1990, pela primeira vez na história, um time da África Negra consegue assustar europeus e sul-americanos. Ali, valeu pelas quartas de final, depois seguiram-se boas campanhas como o ouro olímpico em Sidney e o vice-campeonato da Copa das Confederações em 2003. O time de Eto'o e Song é, no papel, o melhor time africano, apesar de no plano continental, não ter conseguido suplantar o Egito, atual tricampeão do torneio. O time terá um desafio duro com os dinamarqueses, mas vai precisar transformar a sua qualidade em competividade para lhes tirar a vaga.

Japão: O sonho de se tornar uma potência futebolística tem feito os japoneses evoluírem brutalmente no futebol. Se o futebol local era completamente inscipiente nos meados do século 20º, a punição por ter perdido a guerra ainda serviu para atrasar seu futebol. Dos anos 80 para cá, com um intercâmbio interessante como futebol brasileiro e mundial, os japoneses fizeram progressos interessantes. Classificaram-se para as seis últimas copas da ásia e ganharam três delas - bem como estiveram nos três últimos mundiais (em 2002, enquanto seleção-anfritriã). Como uma base atuando no futebol nacional e liderada pelo experiente Nakamura, o time pode fazer uma campanha honrosa, mas o grupo em que caiu lhe é desfavorável.

GRUPO F

Itália: Eis a atual campeã mundial. Os italianos tinham o grande time do futebol europeu no pré-Segunda Guerra e levaram as copas de 34 e de 38 - a última de maneira controversa, dizem. Depois disso, serviu de sparring na final da Copa de 70 para o Brasil - na sequência de ter vencido a Euro 68 -e reapareceu para ganhar o improvável título de 82. Em 94 o Brasil lhe dá novamente o troco e a azurra vai tropeçando em cima de um futebol burocrático, retrancado, angustiante. De repente, não mais do que de repente, a Itália vai para a Copa da Alemanha vivendo uma grave crise no seu futebol e com uma seleção que não consegue mais vencer, até que, como o Brasil de 02, assiste os favoritos tropeçarem um a um, conta um pouco com a sorte e vence, nos penâltis, a França na final. Os últimos quatro anos não foram lá espetaculares para a Itália, ainda que não tenham sido ruins: Uma classificação complicada para a Euro 08, depois de ter caído num grupo duro, depois uma eliminação nos penâltis contra a futura campeã Espanha na Euro, classificação tranquila para o mundial num grupo fraco e sorteio para um grupo administrável na Copa da África. Basicamente, o time de hoje é não é muito diferente do time de quatro anos atrás, retrancado, tem um baita goleiro como Buffon, uma boa zaga com nomes como Cannavaro, um meio de campo que marca muito, mas ausente de criatividade - onde o volante Pirlo é o destaque - e um ataque bom, mas longe de ser de ponto com Iaquinta e Gillardino. A equipe de Lippi joga aquele velho futebol cadenciado, de toque de bola, a espera de buracos. Fosse a Copa jogada em pontos corridos e a Itália não teria lá muitas chances, com esse estilo de jogo num torneio eliminatório de tiro curto, ela se credencia, muito embora corra por fora - e por mais difícil que seja repetir 2006, ela está aí.

Paraguai: Os confrontos entre seleções na América do Sul, ao contrário do que acontece na Europa, quase nunca são marcados por rivalidades políticas maiores do que as futebolísticas. Talvez isso se deva ao fato de que o único grande confronto bélico no continente tenha sido marcado pela derrota incontestável de um país, cuja única falta foi tentar defender o solo sagrado de sua pátria - e por conta disso foi massacrado por seus vizinhos. Esse país é o Paraguai. Uma nação próspera reduzida ao pó nos fins do século 19º e, desde então, desdenhada por todos. Paraguaio, no Brasil, acima de tudo, é um defeito. E é pelo futebol que os paraguaios expressam seu espírito de resistência. Não adianta dizer que o Paraguai vai para sua quarta Copa seguida e que fez campanha maravilhosas nas últimas eliminatórias, afinal, é o Paraguai. Quando tinha uma equipe boa, primeira colocada nas eliminatórias para a Copa da França, dizia-se que era apenas uma defesa forte sem ataque, um time, destinado a cair novamente na obsolência quando seus defensores se aposentassem. Não é que o Paraguai se renovou? E não é que formou atacantes? Nas últimas eliminatórias, os paraguaios começaram arrasando, mas depois foram alcançados por chilenos e brasileiros, ainda que tenham ficado apenas um ponto abaixo do Brasil e perdido a segunda colocação no saldo de gols para o Chile - em suma, bem acima da Argentina e do Uruguai, campeões mundiais que suaram a camisa. Aqui, são favoritos para a segunda vaga e podem fazer uma campanha melhor do que muita gente imaginava, afinal, não só na política e na economia é a vez da América do Sul, no futebol também.


Nova Zelândia: Desde que a sua vizinha Austrália abandonou a Confederação da Oceania, restou a Nova Zelândia a sina de jogar contra seleções semi-amadoras das ilhas e arquipélagos que a circundam. Quatro anos de auto-enganação e desperdício de forças, onde a seleção local, destacada pela força física, fica treinando para a Copa. Aqui, dificilmente conseguirá seguir adiante.


Eslováquia: Era parte da antiga Tchecoslováquia, com a divisão do país, uma antiga potência futebolística do leste europeu, ficaram seus vizinhos tchecos com a técnica e os eslovacos com a força - o que, no entanto, foi o suficiente para superar a República Tcheca no seu grupo das eliminatórias assim como ficar a frente de eslovenos e polacos. São, junto com a Eslovênia, classificada na repescagem, e com a Sérvia, as três únicas seleções europeias orientais a chegar na Copa da África, sem muito brilho, enfraquecidas por divisões nacionais com ou sem muito sentido.

GRUPO G


Brasil: Trata-se do único país que chegou a todas as copas do mundo e, desde os fins dos anos 50 e o fenômeno Pelé, chega aos torneios com status de potência do futebol, apesar de que na geopolítica restava insignificante, submetido aos EUA, e, na economia, um país promissor, muito mais por suas potencialidades do que pela prática de sua política econômica. O Brasil mudou de lá para cá. Mudou muito. Hoje, a nação é vista como um dos principais atores do teatro das nações. No futebol, depois do fiasco de 2006, quando foi levado para a Alemanha um verdadeiro time dos sonhos que acabou fracassando fragorosamente, foi trazido o ex-capitão da seleção Dunga para o cargo de treinador. Mesmo com todas desconfianças por nunca ter treinado antes, Dunga estreiou vencendo a Argentina por 3x0 e foi construindo uma seleção debaixo da lógica que Parreira utilizou em 94: Montar o melhor time pelo conjunto e não pelos destaques individuais, com um jogo habilidoso com a burocracia da CBF,  o que resultou em quatro anos de estranha tranquilidade, onde o time venceu tudo: Ganhou a Copa América (novamente sobre os rivais argentinos), a Copa das Confederações (contra os EUA, que frustrou a esperada final contra a Espanha) e ainda terminou em primeiro as eliminatórias de seu continente. Nunca antes na história o Brasil teve um quadriênio mais tranquilo, muito embora o tenha tido com uma seleção que não é o melhor time, mas o time que melhor funciona junto segundo a metodologia do seu treinador, um time que seja cada vez mais uma seleção de brasileiros e não mais brasileira - dada a quantidade de jogadores atuando no exterior, mesmo num cenário onde a crise na Europa e o fortalecimento da economia nacional tenham produzido um retorno em massa de craques. Sem ufanismos, é o time a ser batido, quer seja pelo desempenho ou pelo entrosamento, o que conta contra si é apenas e tão somente  o fato de ser o dono da casa daqui a quatro anos e de que um hexa brasileiro, politicamente, talvez não interesse.

Coreia do Norte: Presença constante no noticiário global, muito mais por se opôr aos EUA do que pelo seu regime totalitário - escandalizado aos quatro cantos para legitimar seu isolamento e, quem sabe, sua invasão -, os norte-coreanos, que sempre viveram às turras com punições no futebol por motivos políticos - e nunca se destacaram, até que surpreenderam, classificando-se para a Copa da África com um time majoritariamente de jogadores que atuam no seu próprio campeonato e uns poucos atletas da j-league. Não deve ameaçar os competidores do grupo, mas não deixa de ser uma presença interessante.

Portugal: Sempre foi uma das forças médias do futebol europeu, mas jamais conseguiu transformar o material humano produzido nos seus clubes em uma seleção competitiva. Mesmo nos anos 90, quando produziu uma geração interessante, que chegou ao auge nos anos 2000 e 2002 acabou fracassando. O ponto de inflexão foi a contratação de Luis Felipe Scollari, treinador recém campeão mundial pelo Brasil em 2002 que, por pouco, não levou o título europeu de 2004 - perdendo a final para a Grécia -, mas ainda chegou à semi da Copa da Alemanha e as quartas de final da última Euro - em suma, manteve Portugal não apenas chegando nas grandes competições mundiais como as disputando em grande nível, um salto qualitativo que só foi capaz de dar depois de muitos tensionamentos com a liga da clubes locais e a influência que eles sempre exerceram na seleção nacional. Sob o comando do atual treinador, o luso-moçambicano Carlos Queiroz, o time sofreu para chegar à Copa, ficando em segundo no grupo da Dinamarca e sofrendo na repescagem contra a Bósnia. Enquanto seu país arde vítima de um crise econômica considerável, sua seleção nacional aporta na África, continente com o qual nutre relação profunda e tempestuosa, para tentar repetir as boas campanhas dos últimos anos. Ao meu ver, disputa, com alguma vantagem, a segunda vaga do grupo com a Costa do Marfim, o que pode render um clássico com a Espanha nas oitavas.

Costa do Marfim: ex-colônia francesa em uma das regiões mais ricas do continente africano, a Costa do Marfim vem se destacando no futebol europeu de 1992 para cá, quando venceu a Copa da África. Com um time disciplinado, liderado por Drogba, o time está na briga pela segunda colocação do grupo, mas o desastre da contusão do seu principal jogador pode ser uma perda grande demais para ser superada.

GRUPO H

Espanha: O futebol sempre foi um elemento fundamental no complexo tecido sócio-político espanhol do pós-Guerra: Era por meio do futebol que o seu ex-ditador, Franscisco Franco, afirmava o domínio de Castela sobre as demais regiões, investindo quantias fabulosas no Real Madrid, time que apesar de pertencer a uma das mais pobres nações da Europa Ocidental, tornou-se o principal clube daquela região. Era por meio do futebol, como é até hoje, que catalães expressam seu orgulho nacional, especialmente nos anos do franquismo, quando só lhes restava torcer e investir no Barcelona, clube que no fim das contas, fazia às vezes do que deveria ser sua seleção nacional. Tais fraturas e incongruências tornaram o futebol espanhol uma potência no âmbito clubístico e um fracasso entre as seleções. A solidificação da economia nacional dos anos 90 para cá - abalada apenas agora - e, por conseguinte, da sua liga nacional, acabaram construindo uma seleção jovem e forte, que já fez uma campanha boa na última Copa, foi campeã europeia, arrebentou nas eliminatórias para essa Copa e só falhou mesmo na Copa da Confederações do ano passado. Sem dúvida, é uma das favoritas.

Suiça: Como país, a Suiça mais parece uma amontoado de imagens, um campo bucólico com suas vacas e suas belas fazendas e cidades abarrotadas de bancos. A segurança e uma paz demasiada são suas marcas e parecem se expressar em seu time nacional, uma equipe disciplinada taticamente, defensivamente muito forte e ofensivamente inepta. Conseguirão os suiços passarem adiante? Eu suspeito que não, ainda que venham a dar trabalho.

Chile: A primeira vez que o futebol chileno teve algum destaque no futebol mundial se deu quando da realização do mundial de 62, quando terminou na terceira colocação. De lá para cá, sempre ocupou uma posição secundária no futebol sul-americano, aparecendo muito mais por episódios jocosos como o da fogueteria do Maracanã do que pelo seu futebol. A geração atual do futebol chileno, no entanto, tenta provar o contrário, montada lá pelo pré-olímpico de 2000 e com mais e mais atletas sendo formados ao longo desses anos, a seleção chilena arrebentou nas últimas eliminatórias, sob o comando do treinador argentino Marcelo Bielsa, e conta com jogadores conhecidos do futebol brasileiro como Maldonado, Valdívia, Gonzalo Fierro além de bons jogadores como o goleiro Bravo e o centro-avante Suazo. Tem tudo para fazer uma grande campanha na Copa, aliás, precisa fazer uma campanha na Copa, seja pelo seu futebol ou por seu treinador, um dos maiores estrategistas do futebol sul-americano que acabou tendo seu currículo manchado com o fracasso na Copa da Ásia quando treinava sua seleção nacional. Acho que leva a vaga e pode protagonizar um belo confronto com o Brasil nas oitavas.


Honduras: Enquanto vivia às voltas com as incertezas políticas, depois de ter vivenciado recente golpe de Estado, Honduras conseguiu um classificação heróica na Concacaf, onde sempre EUA e México monopolizam as vagas e deixam o terceiro lugar para ser disputar à tapa pelos seus vizinhos. Aqui, terá enormes dificuldades para seguir adiante, esperamos que o futebol sirva muito mais como elemento de reconstrução nacional do que como instrumento de afirmação de golpistas por meio do ufanismo - como infeliz e normalmente costuma ser nessa América Latina de meu deus.

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