quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Dilma e a Economia Brasileira em 2011

Em meados de 2008, o Brasil via-se às portas do choque da crise mundial que eclodia. Naquele momento, uma verdadeira quebra de braço se operava nos meandros do governo: de um lado, o Banco Central, chefiado por Henrique Meirelles, defendia a ortodoxia monetarista, do outro, a Fazenda sob o comando de Mantega apontava para uma saída desenvolvimentista.

Meirelles ganhou a briga num primeiro momento, o governo não mexeu nos juros e as medidas de contingência foram tímidas. Depois de alguns meses de calmaria - entre o final do terceiro trimestre e o início do quarto trimestre -, veio o choque em Dezembro com demissões massivas que abalaram o bom nível de geração de emprego naquele ano.

Isso mudou tudo na política econômica do governo. Mantega passou a ganhar as quebras de braço, bancou um uso massivo do mecanismo de política contracíclica - com investimentos estatais massivos -, forçou os juros para baixo e trabalhou duro para capilarizar mais ainda o mercado creditício brasileiro. Mais crédito, mais salários, mais empregos. O mercado interno compensou o baque do mercado externo.

Mas é claro que nem tudo são flores: depois do choque financeiro nos países ricos, veio a inépcia, o que fazer? O fato é que um misto de decisões políticas erradas somadas ao agravamento de velhas fissuras no tripé - EUA, Japão e UE - do Capitalismo Mundial acabaram por inaugurar esse segundo tempo da crise.

No plano interno, o Brasil tem arcado com fenômenos interessantes: um deles, é o abalo social causado pela aplicação do primeiro projeto nacional desde Vargas; a classe trabalhadora se viu  economicamente empoderada e com crédito farto à sua disposição - crescimento econômico de  dentro para fora pela primeira vez em décadas.

Se o Brasil nada cresceu em 2009 pela hesitação do Banco Central, em 2010 ele recuperou o tempo perdido e cresceu 7,5%. Elas por elas, realizamos o que ficou estagnado em 2009 e crescemos algo de novo. Mas um fenômeno interessante que se operava ali atenta para as possibilidades e limitações do projeto conciliador lulista: inflação.

O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrou 4,31% de alta mesmo com a estagnação de 2009, subiu para 6,47% com o aquecimento de 2010 e está, ainda, em aceleração: o acumulado dos últimos 12 meses é de 6,71% (com base em Junho). Um detalhe importante é que esse fenômeno se opera a despeito da valorização internacional do Real - com o adendo da desvalorização de moedas importantes como o Dólar e o Euro.

Isso foi motivo de preocupações da equipe econômica dilmista, certamente menos ortodoxa do que a de Lula: embora tenha mantido o mesmo critério do seu antecessor para reajuste do salário mínimo - crescimento de dois anos antes mais reposição da inflação do ano anterior -, vimos contingenciamentos de verbas em quase todos os setores além de alta nos juros para esfriar a economia.

Dilma executou uma agenda de tentativa de saneamento das contas públicas  - corte no custeio para abrir espaço para o investimentos efetivos - com uma tentativa de frear a economia pelo mecanismo dos juros - embora, relativamente ao aquecimento geral da economia, eles não estejam tão altos quanto há alguns anos. O problema, agora, é que a taxa de crescimento caminha para módicos 4% (ou nem isso) e a inflação continua seu curso.

Crescer qualquer coisa como 3,7%, além de mais alto do que a média, seria algo como a média do biênio atípico de 2009 e 2010, mas o estranho nesse processo é a alta dos preços, ou nem tanto: quanto mais emprego e renda, maior é a força dos sindicatos reivindicarem mais emprego e mais renda, mas isso não vem impunemente. 

A propriedade dos meios de produção ainda é privada, o que permite uma reação a tal processo pelo repasse dos dos ganhos laborais para os preços. Esse é o grande problema não resolvido pelo keynesianismo, que colaborou para sua implosão a partir dos anos 70. 

Exemplos em um sentido contrário, crescimento do emprego sem geração massiva de inflação, talvez só os Estados Unidos de Clinton, ainda que às custas de uma bolha financeira e com o artifício que permitiu, pelo menos até bem pouco, aquele país passar incólume pelas inerências do Capitalismo: a saber, sua política neoimperialista.

Há um outro ponto sobre o caso brasileiro que merece a devida atenção: como aborda o filósofo Vladimir Safatle em recente artigo para a CartaCapital, escapamos ao breve e tardio (em comparação aos nossos vizinhos) processo liberalizante retomando, numa roupagem melhor e mais "social", do velho Capitalismo de Estado. Isso traz problemas importantes.

Um deles, é o aumento do grau de concentração de mercado, logo, um aumento da probabilidade de aumento da inflação. Isso é um ponto politicamente delicado de se resolver, mas "resolvível" dentro de um horizonte reformista.  A problemática do exército de reserva, no entanto, vai longe.

Dilma, em medida recente, pretende contingenciar mais verbas para cortar a taxa de juros - a velha política de não esquentar a economia -, o que me parece um equívoco, seja porque juros incidem diretamente sobre o serviço da dívida - que é gasto - ou porque o caminho, hoje, me parecia mais no sentido de usar o mecanismo fiscal como forma de contenção da inflação - sim, aumento da carga tributária -, o que ainda poderia ser usado, de forma calibrada, para investimento produtivo.

Aumentar tributos é perfeitamente possível, sobretudo se você cobrar dos lugares certos. Grande parte da revolta atual com tributos porque eles incidem, coincidentemente ou não, sobre a (ainda) paupérrima massa assalariada, mas não tanto quanto poderia ser sobre o sistema financeiro. 

A discussão sobre a sustentabilidade do valor atual do Real - e do grau de concentração do mercado importador, aparentemente alto - vão, inclusive para mais longe, mas o uso de instrumentos fiscais pode surtir efeitos aí também, nem que seja para dirimir de uma forma inteligente a especulação.

Seja como for, insisto que viveremos tempos interessantes tão logo.






Um comentário:

  1. Bem interessante os argumentos, claros e postos com lucidez, mas gostaria muito de enxergar pelo mesmo prisma.. enfim.. vamos esperar sempre o melhor!

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