segunda-feira, 23 de julho de 2012

Revisitando a Primavera Árabe

Monet - Lavacourt d'Inverno (daqui)
Há um ano e meio, a Primavera Árabe florescia durante o inverno do hemisfério norte, contudo, em um cruel paradoxo histórico, ela chegou ao seu inverno ainda na última primavera. Mas no inverno,  mesmo em um tão longo e rigoroso, há vida, sempre houve e haverá.

A irrupção na Tunísia da revolta que se espalhou pelo mundo árabe, do Magreb à península arábica, encontrou sua culminância no Egito: de repente, a Praça Tharir se tornou o centro nevrálgico de um mundo árabe que se levantava, catalisando uma segunda onda que se espraiou pelo mundo - da Espanha dos indignados que lotaram a Puerta del Sol até os inúmeros occupy pelos Estados Unidos e pelo mundo (Brasil, inclusive).

Hoje, o que temos? No Egito, a Irmandade Muçulmana capturou (eleitoralmente) a Revolução que não fez - nem faria e jamais fará -, enquanto na Líbia, o Ocidente se aproveitou da balbúrdia geral para estimular uma revolta à la Pancho Villa para derrubar seu pouco confiável Kadafi - justiçado barbaramente pelos rebeldes -, já na Tunísia, ainda que de forma mais moderada, os islâmicos estão no poder e, por fim, o regime baatista da família al Assad está prestes a tombar na Síria, enquanto uma guerra civil sangrenta faz o país arder.

Não, este não é um post sobre a sorte triste das revoluções, mas sobre a realidade histórica e as limitações reais - não objetivas ou subjetivas, reais - das lutas materiais bem como um chamado à urgência da boa estratégia política - coisa que Maquiavel, ao seu tempo, soube captar de forma tão singela e sublime. Lá (tal como cá) temos tensões de força e vetores, o que não faz com que a experiência vista ano passado seja inválida, nem que, por isso, deixemos de enxergar que estar a haver uma reação relativamente efetiva.

Sem sombra de dúvida, não podemos deixar de agir pelo medo da captura ou do fracasso, mas isso não quer dizer que possamos agir sem concebê-los - na alegria da imanência. E foi a Primavera Árabe que deflagrou, em termos práticos, a única experiência política de multitudinária que, durante esta crise mundial, consigo realmente preocupar e perturbar o Poder - ainda que, não nos esqueçamos, Wikileaks, e suas revelações sobre a Tunísia, teve um papel fundamental para disparar seu estopim.

No que toca à experiência subsequente dos occupy, como nos ensina o mestre David Harvey: as metrópoles - ao contrário do que todo o pedantismo dos catastrofistas não cansa de exclamar de forma cansada - são o locus da potência revolucionária contemporânea. A luta segue e os desdobramentos da Síria e, curiosamente, da política interna israelense, são cruciais no que toca ao Oriente Médio, bem como o decorrer da crise na periferia da Europa, sobretudo na Grécia e na Espanha. E onde há resistência não há derrota.

2 comentários:

  1. Olá, Hugo,

    Na época, as multidões nas ruas do Cairo me empolgaram muito. E depois vieram a Líbia, o Barein, o Iêmen e, agora, a Síria. Apesar de seu post tentar fugir de uma "sorte triste das revoluções" a verdade é que em boa parte delas, pra não dizer em todas, a revolta popular que remove os opressores do poder é geralmente contida por outro grupo de poder que ocupa o espaço deixado vazio. As vezes dá-se um (grande)passo atrás para depois avançar dois à frente. As vezes fica-se no grande passo atrás, como no irã de 1970. Para mim o Egito ainda é uma grande esperança. Ainda que o novo governo, que de forma controvérsia ou não foi eleito pelo voto dos cidadãos, não seja o governo dos sonhos dos egípcios, se pelo menos servir para consolidar o processo eleitoral, que é um dos pilares da democracia, já terá sido um grande passo e um grande exemplo para a região. Mas isso ainda vai levar alguns anos pra saber, se o exército egípcio não interromper a festa antes.

    Sobre a Espanha e a Grécia é frustrante ver que apesar das grandes mobilizações dos "indignados", é a Direita quem leva a melhor nas urnas.

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    1. Edu, é um processo fascinante e monstruoso que ainda está em curso, precisamos nos investir da alegria mais singela, festejar cada derrota e receber com placidez cada batalha vencida.

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