quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Dilma e a PUC-SP como uma Aldeia de Asterix


" Toda a Gália foi ocupada pelos romanos... TodaNão! Uma aldeia povoada por irredutíveis gauleses ainda resiste ao invasor. E a vida não é nada fácil para as guarnições de legionários romanos nos campos fortificados de Babaorum,AquariumLaudanum, e Petibonum..."
(prólogo de todas as edições da série Asterix).

No início desta semana, os dois atos pró-Dilma ocorridos na PUC-SP tomaram proporções inacreditáveis. O encontro de intelectuais e artistas no Tuca ultrapassou o teatro, se tornando uma manifestação espontânea, multitudinária e mágica. Na terça, o ato dos estudantes na prainha, centro nevrálgico do campus Monte Alegre, tomou vida e virou algo mais -- e deu tão certo que, no seu fim, foi atacado por um enxame fascista.  

O interessante, em ambas as ocasiões, é que os atos saíram do controle da própria organização e, curiosamente, tomaram uma forma própria. O que conferiu esse novo design é uma confluência curiosa que se formou a partir do segundo turno: a potência constituinte, essa força da multidão na direção da geração de direitos, fluiu através da candidatura petista de Dilma Rousseff; o que era, a princípio, apenas um veto à candidatura de Aécio Neves -- a perspectiva de retrocesso, da eliminação de direitos --, tomou um caráter positivo e propositivo.

É essa potência o fator que que mudou os rumos da atual eleição. E justamente quando tudo, absolutamente tudo, parecia caminhar para uma vitória certa do conservadorismo -- em um segundo turno que seria, seria, um passeio do conservadorismo, com a esquerda sem prumo e desistente.

Ainda que a eleição persista em empate técnico, Dilma segurou a ascensão do adversário e, agora, tem uma ligeira vantagem, com menos rejeição do que ele. A questão vai além das eleições, ela diz respeito a deflagração de um processo político outro, maior, cujas repercussões vão sim afetar um segundo mandato seu ou o eventual governo Aécio.

E a grande questão é que esse movimento, precisamente, não está sob controle do lulo-dilmismo, ele é uma força autônoma que encontra na candidatura Dilma, apenas e tão somente, um ponto de consistência: é ali que ele se corporifica, não onde ele existe. É uma ilusão de ótica supor que esse movimento é fruto de algum engano das massas -- e isso vale para quem diz isso a partir de uma posição contrária ou favorável a Dilma --, trata-se de uma manifestação da prudência -- no sentido clássico, isto é, saber prático -- da multidão face à vida como ela é.

Foi esse processo que esteve na cerne dos comícios gigantescos de Dilma na periferia de São Paulo e no Recife, mas foi na pequena PUC-SP, quase como a última aldeia gaulesa cercada pelo Império Romano, que isso foi catalisado simbolicamente. Lá, justo na PUC-SP que pelejou tanto pela democracia, mas que ficou tão parada em termos do debate extra-muros, situada em meio a uma área, geográfica, majoritariamente conservadora. 

A experiência desta semana na PUC-SP foi inacreditável, surpreendente e revigorante. Em sete anos de PUC, entre a graduação e o mestrado, eu jamais suporia que algo assim pudesse acontecer; segundo a triste realidade do nosso tempo e da minha alma mater, tudo parecia pender entre o conservadorismo de classe -- ainda que mitigado pelo ethos da instituição e alguns aspectos do catolicismo -- e um radicalismo sem rumo.

Em meio a uma eleição tão angustiante, em tempos tão angustiantes, a brecha que se abre é, precisamente, uma que aponta para um segundo governo de Dilma necessariamente mais democratizante -- ou isso ou será a paralisia completa -- ou um governo Aécio que já nascerá com um núcleo duro de oposição montado. Pouco importa para onde a História se desdobrará, quando as condições objetivas são determinadas desde baixo, não há como o Poder escorregar. 

Eu vou com Dilma na disputa voto a voto nesses dias, será difícil, mas aconteça o que acontecer, eu já estou feliz pelo sentido que esses últimos dias tiveram -- e que eles ainda podem dar para o nosso futuro próximo.


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